Este blog, mais do que "mãe de coração" tem
"fragmentos de uma vida comum".
Uni os dois blogs e, aqui, falo de adopção em geral,
da nossa experiência e de outros pedaços da minha vida.
Este blog, mais do que "mãe de coração" tem
"fragmentos de uma vida comum".
Uni os dois blogs e, aqui, falo de adopção em geral,
da nossa experiência e de outros pedaços da minha vida.
O 3º dia amanheceu sem chuva mas um tanto escuro. Este seria o nosso último dia, à noite regressaríamos a casa, não sabíamos se a dois ou a três visto que o nosso rapaz ainda não se tinha manifestado, mas, naquele momento, estávamos apenas concentrados no que estávamos a viver.
O pequeno almoço foi muito calmo, éramos os únicos clientes na sala àquela hora da manhã. Antes de sairmos para irmos buscar as nossas malas para fazer o check out o meu filho perguntou se íamos de manhã à instituição porque precisava de falar com a Dr.a X, ainda não me podia dizer o que era. Confirmei-lhe que tínhamos de lá ir falar com ela, organizar o dia. Quando lá chegámos ela pediu para falar com ele a sós e depois veio-nos comunicar que ele tinha decidido regressar connosco. Confesso que apesar de feliz e aliviada não foi algo que mexesse comigo, aqueles três dias (que pareceram semanas) estavam rodeados de uma espécie de névoa onde os sentimentos vão de superficiais a profundos e vice-versa em segundos. As situações foram-se desenrolando como se não estivesse bem ali, não sei como explicar de outra maneira. Só passados alguns meses é que desejei poder voltar a essa semana e viver e sentir tudo com o espírito que merecia o momento, mas acho que a vida é mesmo assim.
Enfim, era o último dia de aulas, dia do desfile de carnaval da escola, e por isso fomos preparar algumas coisas para a despedia, quer dos amigos da escola, quer dos da instituição. Fizemos as malas dele, recolhemos os seus pertences. Ele foi dos que quis trazer tudo (se bem que na semana seguinte devolvemos a maioria da roupa à instituição porque já não a queria vestir!).
Depois de almoço fomos até à porta da escola ver sair o desfile, ele não queria participar, nem se quis mascarar.
No tempo que estivemos à espera foram várias as pessoas que nos vieram cumprimentar, perfeitos estranhos para nós mas que nos conheciam. Todas elas de uma forma ou de outra tinham participado na vida do meu filho e ele fizera questão de nos apresentar através do álbum de fotos que tínhamos enviado para ele. Naquele momento, contudo, ia-se escondendo e fugindo um pouco, como se a realidade fosse maior do que o seu coração conseguisse "digerir".
Quando os primeiros colegas começaram a passar os olhares curiosos aumentaram e a festa que lhe fizeram encheu-me o coração. Ele manteve-se agarrado a nós e nem as tentativas de todos os que conhecia, o fizeram despregar de perto de nós. Foi preciso o pai arrasta-lo pela mão para que se envolvesse, e lá foi ele feliz com os amigos, mas sempre de olho em nós...e nós nele!!!
Falar das despedidas que ele teve de fazer parece-me redundante. Todos sabemos, de uma forma ou de outra, como são complicadas, emotivas, tristes e cheias de esperança. Na instituição despedem-se dos que saem com um cântico e grito de alegria que, os colegas de casa, são como que forçados a sentir, apesar de não o sentirem...muitos, crescidos, conscientes de que a probabilidade de virem a viver em família é quase nula!!! Foi para mim um dos momentos mais difíceis de toda esta viagem, à parte tudo o que havia vivido/sentido até ali, naquele momento, olhar aqueles rostos de olhos tristes tirou-me um pedaço do coração e confesso sentir-me a pior das mulheres por não te-los trazido a todos para casa!!!!! Sei que seria irrealista, mas não pude evitar o sentimento!
Ao encetarmos a viagem de regresso a casa, por diversas vezes precisei olhar para trás para confirmar que estava lá, não só porque era bom demais, mas porque ele veio, quase sempre, calado com o olhar perdido no horizonte... tudo o que eu podia fazer era dar-lhe a mão e sorrir quando os nossos olhares se cruzavam. Aquele era o momento dele, e por muito que me custasse a sua tristeza não pude deixar de admirar a sua coragem - de um momento para o outro, ali estava ele, dentro de um carro com dois estranhos, em direcção sabe-se lá a onde, para recomeçar, novamente, a sua vida!
...e quando menos esperava, entrou em casa, correu as divisões todas à pressa, entrou no seu quarto, atirou-se para cima da cama e exclama: - Finalmente, na minha cama!
O dia seguinte amanheceu nublado e chuvoso, assim aproveitámos para dar uma pequena volta numa cidade próxima e comprar umas roupitas novas para ele vestir no dia seguinte (supostamente seria a sua despedida). Também nos tinham dito que além de ter pouca coisa poderia não querer trazer nada para casa.
Convenhamos que estas primeiras compras não foram fáceis. Primeiro dizia que não precisava de nada, depois disse que gostava de ter um perfume (era o que estava à frente do nariz), quando lhe mostrava alguma camisola, camisa ou calça, a resposta era invariavelmente: - Tu é que sabes! Saímos da loja com uma muda de roupa e pouco mais. Procurámos mais duas ou três lojas e só na última é que se decidiu a comprar alguma coisa, o problema aí é que queria tudo, mesmo que não tivessem o número dele ele queria levar, e então aí começou a primeira "intervenção parental" e os primeiros "nãos".
Almoçámos ainda na cidade, mas com o tempo a piorar resolvemos regressar ao hotel e aproveitámos para nos enroscarmos os três na cama a ver televisão, depois pediu para jogar computador e eu aproveitei para fazer alguns telefonemas para a família ansiosa. Pareceu-me ridículo estar assim uma tarde, sem fazer nada com ele, sem ir a algum lado, sem lhe mostrar algo, com muito pouca conversa...por isso liguei (novamente) à minha irmã, mãe, conselheira e amiga que rapidamente se riu dos meus receios (é a parte boa das irmãs e amigas, não têm pudores em nos chamar à terra). Como ela disse - Queres melhor momento para criarem uma ligação forte do que estarem juntos em silêncio?Aproveita o momento para respirar, ele vai sentir que estás relaxada e ficará também! - E assim passámos o resto do dia.
Ao final da tarde saímos para lanchar e depois fomos à instituição buscar uma muda de roupa para ele, tinha decidido passar já aquela noite connosco. Jantámos e regressámos ao hotel. Vimos mais um pouco de TV, jogámos a dois e a três no computador (não tínhamos mais jogos) e na hora que a mim me pareceu razoável disse-lhe que era hora de dormir. Preparou-se sozinho e depois de se deitar estivemos os dois a brincar com muitos beijos e cócegas pelo meio e de repente as suas gargalhadas foram-se transformando em musica para mim, as mesmas gargalhadas que no dia anterior tanto me tinha irritado!!! Enfim, acho que o amor tem destas coisas, quando menos se espera é que se sente...
Termino com este primeiro parágrafo. Quando comecei a escrever este post pretendia fazer um pequeno relato do que tínhamos feito na semana em que fomos conhecer o meu filho, principalmente porque foi uma das épocas de maior ansiedade para mim, a altura e o antes, não sabia o que seria suposto fazer nesses dias. Há medida que escrevia percebi que havia pormenores que gostaria de recordar mais tarde e por isso fui incluindo, tentei não repetir muito o que já havia falado em posts anteriores mas nem sempre foi possível, assim acabei por dividir em 3 dias este tema, e aqui está o primeiro.
Segundo nos explicaram na SS, a regra para o primeiro contacto, entre os pais e a criança, é de uma semana (de segunda a sexta). No primeiro dia estarão presentes as Assistentes Sociais (AS) de todos os órgãos envolvidos no processo, nos restantes a criança passa o dia com os pais mas regressa ao fim do dia à instituição e no último dia, se tudo correr bem durante a semana, os pais podem, então, levar a criança para casa.
Todas as saídas têm de ser autorizadas pelas AS da Instituição, ainda que só possamos conhecer o nosso filho depois de recebermos a notificação do tribunal que nos indica como tutores provisórios. Como ao fim-de-semana, as AS não estão na casa, os pais não podem ir buscá-los.
Connosco, contudo, não foi bem assim!
Primeiro, porque a burocracia atrasou o nosso primeiro momento, depois tivemos de coordenar as nossas agendas pessoais (o meu marido ainda estava em consultas e tratamentos) e entretanto, a agenda das AS da SS que nos iriam acompanhar também estava sobrecarregada. Assim, ficou agendado o 1º encontro para uma quarta-feira (na semana seguinte era carnaval o que implicaria adiar mais duas semanas o encontro). Sendo o nosso filho já crescido disseram-nos que havia a possibilidade de trazê-lo para casa na sexta-feira dessa mesma semana.
E, então, rumámos em direcção ao desconhecido! Em determinado momento da viagem inspirei fundo e pensei que aquelas eram as ultimas horas de uma família de dois, que dali em diante nada mais seria igual, e segui viagem com o nó no estômago e um turbilhão de coisas na cabeça. Á chegada ligámos às nossas AS que estavam atrasadas e assim tivemos de aguardar na rua por elas (tudo a incrementar a nossa ansiedade). Meia-hora depois, a quatro entrámos na Instituição e fomos encaminhados para uma sala com mais quatro AS's - duas da instituição e duas da SS local - onde nos iriam apresentar todos os dados disponíveis sobre o nosso filho. "Têm alguma questão para nos colocar?" - perguntaram. Respondi: - "Mil, mas não me lembro de nenhuma.".
De seguida fomos levados para uma salinha de estar e então apresentaram-nos o pequeno! Se nós, adultos, estávamos nervosos imaginem uma criança de nove anos. Não o abracei (embora de ardessem os braços de desejo), perguntei apenas se lhe podia dar um beijo (havia lido algures que devemos respeitar o espaço físico das crianças e nunca dar beijos ou abraços sem antes pedir licença), e sentámo-nos para conversar (as AS da instituição estavam presentes). Confesso que não sabia o que lhe dizer, parecia que era a primeira vez que estava em frente de uma criança, de repente não sabia o que dizer ou fazer...foi tudo muito estranho! Optei pela sinceridade e disse-lhe que estava nervosa e que não sabia muito bem o que lhe dizer. Sem me olhar directamente disse: - Eu também! ... Sugeri, então, revermos o álbum de apresentação que ele havia feito para os futuros pais, e assim passámos em revista toda a informação que lá colocou e actualizámos as coisas, afinal já era informação antiga (tinha sido feito no Verão anterior).
Depois as AS propuseram que ele nos fosse mostrar a vila, a pé, e ele decidiu levar-nos ao parque de diversão no centro, mas pediu que as AS fossem connosco (disseram-nos que por norma é sempre assim). Quando saiu à porta deu a mão ao "pai" e lá foram os dois na conversa, eu segui atrás para deixa-los travar conhecimento, até ali era eu que tinha falado mais. As AS seguiam bem mais atrás e ele nem procurou por elas. Há hora de almoço fomos leva-lo à instituição para o almoço, ainda não estava preparado para almoçar sozinho connosco. De tarde foi hora de passear de carro connosco. (convenhamos que nunca vi uma atracção tão grande por botões, por mais que o chamasse À atenção esteve sempre a abrir e fechar o vidro ao lado dele!!!)
Procurámos alguns locais para visitar, monumentos, castelos e fomos ambientando-nos uns aos outros. A determinada altura ele hesitava na forma de nos tratar, ora era pelo nome próprio ora por mãe e pai, ora era por você ora era por tu. Foi o momento de o esclarecer, sim seriamos os pais dele, sim podia tratar-nos por tu e poderia escolher entre tratar-nos pelo nome ou mãe e pai. Ficou em silêncio e no momento seguinte já era tudo natural e simples. Éramos o pai e a mãe (se bem que o pai foi primeiro e sem hesitação, o mãe custou um pouquinho mais a sair).
Quando regressámos do passeio fomos fazer o check in ao hotel onde ficaríamos, quisemos que fosse connosco para saber que estaríamos por perto apesar de não estar connosco. Foi com alguma surpresa que viu uma cama a mais no nosso quarto (havíamos reservado um quarto triplo para qualquer eventualidade) e por isso explicámos-lhe que a cama seria para ele caso quisesse dormir connosco. Ficou pensativo e respondeu: - Amanhã eu fico! - Ok, será como tu escolheres. - respondi. Jantámos os três e fomos deixa-lo de seguida à Instituição, se o dia não tinha sido como eu imaginava, o momento de o deixar foi muito pior.
Chegados ao hotel desmoronei, estava a sentir-me a pior das mulheres, das mães, como explico no post Quando encontrei o meu filho...
Em Novembro escrevi sobre a nossa rotina de deitar no post Quando a noite cai! e ao fazê-lo pensei se não estaria a dar um "tiro no pé" já que sempre que elogio algo, logo se estraga. E assim foi!!!
Umas semanas antes do Natal, com toda a ansiedade a situação complicou-se e tivemos de cortar com as excepções de fim-de-semana. A verdade é que apesar de o pequeno não ter gostado da notícia, ajudou bastante a que acalmasse as noites dele. Claro que com as festas as coisas complicaram-se mas para o final das férias o sono foi reposto e as noites acalmaram.
Ainda assim resolvemos manter o horário apertado, agora a dificuldade é levá-lo até à cama. Todos os dias tenta "esticar a corda".
No post Sleep tight!, do blog Kinetic Kids, vêm mencionadas algumas dicas para noites tranquilas e os tempos de sono consoante as idades. Então, diz que as crianças:
de 1 a 3 anos precisam de dormir 12 a 14 horas
de 3 a 5 anos precisam de dormir 11 a 13 horas
de 5 a 12 anos precisam de dormir 10 a 11 horas
e acima dos 12 anos precisam de 8 a 9 horas de sono.
E dá como dicas para uma noite tranquila:
Manter a hora de dormir consistente (não tem que ser imóvel, apenas regular).
Criar uma rotina de dormir relaxante.
Desligar estimulação eletrónica uma hora antes de dormir e manter TV's e computadores fora do quarto.
Evitar cafeína.
Uma vez na cama, ser firme - não deixar que os seus filhos tentem protelar ou sair da cama.
Convenhamos, essa coisa de ser firme e não o deixar protelar a ida para a cama, não é que não tente, mas está cada vez mais complicada e se é para manter a rotina relaxante não estou a ver como!!!!!
Sou contra todo o tipo de violência. Sou contra o desrespeito pelas crenças individuais. Sou contra um mundo onde a maioria seja castigada por acções de uma minoria. Sou contra o mundo que temos no momento.
Sei que este não é o tema do meu blog, mas tem a ver com o mundo para o qual estou a criar o meu filho, por isso escrevo.
Gostaria que o meu filho vivesse num mundo onde a liberdade fosse um direito, liberdade de expressão e de movimento, onde o respeito ao próximo fosse um principio indiscutível. Um mundo onde o direito à crença individual fosse respeitado.
Presto aqui, de forma simbólica, a minha solidariedade para com as famílias das vitimas em França e para com todos os verdadeiros muçulmanos que mais uma vez têm de vir a publico defender as suas crenças porque uma minoria escolheu usá-la como escudo para a sua loucura.
Tenho lido vários posts sobre o preconceito na adopção e comentários de pais adoptantes que o sentiram na pele. E eu revejo-me nas situações dia após dia.
Verdade seja dita que com o tempo os comentários vão diminuindo mas quando, finalmente, relaxo é quando me cai um, novamente, que me balança! Balança no sentido em que me irrita, pela ignorânica e dependendo de quem vem é diferente a minha reacção.
Há uns tempos (já largos) numa conversa entre mães falava-se no cansaço, na falta de tempo para nós, nas noites tranquilas sem sobressaltos. Questões que sempre ouvi serem discutidas entre mães, é normal, é natural, acontece, faz parte, não tira pedaço!
Ora, se assim é, porque é que para as mães biológicas a resposta é do tipo:
"Pois é, educar uma criança não é fácil!"
"Ah pois é mãe não tem descanso!"
etc e tal...então porque a mim me respondem com a pergunta!?!?: "Mas estás arrependida??"
AAAAAHHHHHHHHHHHH!!!! Tenho vontade de lhes gritar e insultar. Porque haveria eu de estar arrependida? Porque EU deveria estar mais arrependida que uma mãe biológica? Confesso que a determinada altura me passei um pouco e perguntei em tom irónico: "Porquê tu estás?" achei que o tom era suficinte para lhes cair a ficha...não foi!!! resposta: "ah mas para ti é diferente!" "Ai sim? Porquê? Não foste tu quem decidiu engravidar? Eu escolhi adoptar! Tu quiseste ter um filho? Eu também! Onde está a diferença de escolha?!?".... e assim se calaram as vozes!
Não sei se será assim com todos os pais adoptivos mas para mim parece que tenho de estar sempre a justificar-me, a validar o que sinto pelo meu filho, sei que ninguém tem nada com isso e tão pouco me importo com o que os outros pensam, mas de vez em quando sabia bem poder simplesmente falar/desabafar como qualquer outra mãe sem que com isso me fizessem sentir ...desadequada (por falta de uma palavra melhor!!).
Há uns meses, uma das futuras mamãs de um grupo no FB, enviou-me mensagem a pedir opinião sobre a questão que lhe haviam colocado na SS, sobre a criança que lhe estavam a propor. Sem grandes pormenores que aqui não dizem respeito, tratava-se de irmãos adoptados por famílias diferentes que, por terem relação prévia, deveriam manter.
Sinceramente, foi questão em que nunca pensei. Além de, por puro desconhecimento de causa, achar que nestas situações os irmãos eram sempre mantidos juntos, também, em relação ao meu filho, este nunca conheceu os irmãos/irmãs. Portanto, não sei muito bem como agiria numa situação destas.
Não sei até que ponto é positivo para a criança manter esse fio de ligação ao passado, acho que varia muito das circunstâncias de cada um.
Nós, por exemplo, optámos por manter contacto com dois adultos que participaram na vida do nosso filho nos últimos anos em que esteve na instituição. Com um deles houve mesmo troca, quase semanal, de telefonemas no início, depois fomos espaçando, pois não estavam a ajuda-lo a aceitar o que lhe dizíamos (tudo tinha de ser confirmado com o dito adulto). Hoje mantemos os telefonemas ocasionais em tempos de festas e os emails com as actualizações mais importantes. De dizer que os ditos adultos sempre respeitaram o nosso espaço e nunca forçaram um contacto maior, talvez por isso, e por todo o carinho que deram ao meu filho, quando eu ainda não podia dar, não pretendo cortar definitivo.
Entretanto, encontrei alguns testemunhos de pais brasileiros (como sempre) sobre situações similares. A que partilho, ajudou a ter uma perspectiva diferente sobre a questão.
Logo após o nascimento da minha filha Mariana, tive um tumor no ovário e não pude mais engravidar. Até poderia fazer tratamentos, mas não quis passar pelo desgaste e queria muito ter mais filhos. Foi quando decidimos adotar. Resolvemos que não iríamos impor condições em relação ao perfil desejado. A maioria dos casais quer crianças brancas, recém-nascidas, ficam presos na ideia do que eles consideram a “criança ideal” e não aceitam a possibilidade da criança real. Me coloquei à disposição para atender à demanda real.
Em Franca, havia três irmãos (duas meninas e um menino) que já estavam há dois anos disponíveis para adoção: a mais velha era a Evelin, que tinha de 4 para 5 anos. Depois a Laura, a do meio, e o Victor, o mais novinho. Adotar os três não era uma possibilidade, mas resolvemos conhecer a Evelin. Levamos ela para passear, almoçamos, passamos o dia juntos. Na próxima vez, já tínhamos decidido que queríamos adotá-la.
Surgiu a possibilidade de efetuar uma adoção compartilhada, que funciona da seguinte maneira: cada criança seria adotada por uma família diferente, mas nós deveríamos mantê-las sempre em contato. Conversamos com um casal de amigos que também estava esperando uma criança a respeito dessa possibilidade e eles toparam adotar a Laura. Outra família foi contatada a respeito do Victor e, quando todos concordaram, colocamos o processo em ação.
Cada um foi viver com uma família, cada um tem seus pais, mas eles se encontram regularmente. Nós tivemos desde cedo a preocupação de sempre reafirmar que, apesar de eles morarem separados, são irmãos sim. Na minha casa, por exemplo, tem camas para os outros dois virem passar a noite; outro dia, a mãe da Laura me mandou um e-mail chamando a Evelin para passar uma semana com elas durante as férias. É engraçado, mas, no fim, ganhei mais que uma filha, ganhei uma família extensa, que passa pelas mesmas dificuldades e alegrias. A gente tem bastante respeito. Cada um tem o seu filho, cada um pensa de um jeito. Nenhuma das mães jamais interferiu na forma como as outras criam. É mais uma relação de companheirismo: você tem alguém que entende a sua situação, com quem você pode desabafar, se aconselhar, dar apoio.
A relação lá em casa foi se desenvolvendo de uma maneira boa, com desafios que foram surgindo e foram sendo lidados. O começo nunca é fácil. Para uma criança, abandonar algo que ela já conhece e que, por mais que não seja um bom ambiente, é o que lhe dá segurança, sempre gera ansiedade. Especialmente se você considerar o fato de que ela já tinha sido devolvida antes, duas vezes: ela passa por tudo aquilo, toda a preparação e adaptação e depois é devolvida. É natural não confiar. Às vezes, os candidatos idealizam o primeiro encontro, imaginam um amor à primeira vista. Na prática, é um processo delicado de conquista de confiança. Nós tínhamos que conhecer ela e ela tinha que conhecer a gente... É muita coisa, família nova, escola, professores, amiguinhos, cidade diferente.
Para estabelecer a relação de pais e filhos, tanto de afeto quanto de autoridade, é um processo delicado e que não deve ser imposto, mas trabalhado. Não tem como você falar desde cedo “você vai me respeitar porque eu sou sua mãe”, porque isso não faz sentido algum a não ser que seja real. Precisa ir mostrando, conquistando, mostrar que você está lá para dar ordens, mas também para dar carinho. Você não pode cair nas armadilhas, sentir pena porque sabe que ela passou por muitas coisas, mesmo que isso seja natural. A criança sempre vai testar os seus limites, justamente porque ela precisa ter a certeza de que você realmente gosta dela. Muitas pessoas ficam balançadas quando ouvem um “não te obedeço, você não é minha mãe”, mas esse é o momento exato em que você tem que reforçar que é a mãe sim, para que ela pare de duvidar da validade daquele vínculo.
A gente busca sempre deixar uma via aberta de diálogo. É natural que ela tenha curiosidade sobre a família biológica, sobre sua história. Muitas pessoas querem que a criança venha como um papel em branco e ignoram que tudo o que já aconteceu com ela faz parte do que ela é. Ela veio para nossa casa trazendo em sua bagagem muitas lembranças, que foram incorporadas às nossas. Estamos dando sequência à vida dela e, para isso, a questão da adoção precisa ser processada e reprocessada quantas vezes se fizer necessário. Mas também não precisa explicar tudo de uma vez, até porque eles nem sempre têm a maturidade para compreender o que algumas coisas significam. O melhor é você deixar eles virem até você e ir respondendo conforme as dúvidas aparecem. A Evelin às vezes pergunta a respeito da “mãe da barriga dela”. Ela me perguntou “a gente nasce da cor da barriga?”, eu disse que sim, ela respondeu “Ah... então a Mariana nasceu da cor da sua barriga e eu nasci da cor da barriga da minha outra mãe, né?”. É isso. Você esclarece aquela dúvida, ela fica feliz, mais pra frente vão surgir outras... A gente vai levando.
O mais importante é esclarecer desde cedo que ela não tem nenhuma culpa de ter sido abandonada. Um coleguinha da Evelin um dia disse que, quando ele fazia alguma coisa errada, o pai o colocava de castigo, mas era para o bem dele. Ela veio me perguntar o que ela tinha feito de errado que a mãe dela colocou ela de castigo e nunca mais tirou. Ou seja, de alguma forma, ela se sente responsável por ter sido abandonada. A maneira que encontramos de lidar foi dizer “você não fez nada de errado, ela é um anjo que te fez para você ser trazida pra gente”. Vai chegar um momento em que ela vai conhecer mais da sua história, mas isso vai sendo revelado aos poucos, acompanhando a maturidade dela. E, em certa medida, até ela entende isso. Uma vez ela disse que queria conhecer a família dela e perguntou se eu iria junto. Eu disse que sim, ela logo falou, “mas não agora!”. Eu disse “então, vamos combinar que quando você tiver 18 anos a gente vai?”. Ela achou ótimo e já ficou feliz. É tudo que eles querem – saber que nós estamos ali para eles.
Para o meu filho este iria ser o dia em que iria provar a sua resistência, imaginava que iríamos para um lugar qualquer com muita gente, muita confusão e "farrar" até de manhã! Era o que ele imaginava!!!
Pois para nós a passagem de ano não é assim, não gostamos de confusões, e como temos as famílias separadas, uma a cada lado do país, costumamos aproveitar para no Natal estar com uns e na Passagem de Ano com os outros. Ora se o ano passado foi complicado, devido à saúde do meu marido, este ano ainda foi mais. Por um lado havia as festas a duplicar e as famílias entre cá e lá, por isso decidimos ficar por casa de familiares próximos num jantar simples, passar a meia noite e regressar ao lar.
Fosse qual fosse o motivo, e apesar de alguma resistência inicial, o meu filho acabou por aceitar o plano sem discussão ou birra, como acontece quando é contrariado ou os planos que faz não correspondem à realidade, e assim, tivemos uma noite bastante tranquila... Houve conversas (ainda que aos soluços - repete-se o de sempre à mesa), música, uns parcos foguetes, fotografias qb, o brinde e a luta de passas (por cá são poucos os que gostam de come-las)!!!
Se eu fosse um pouquinho supersticiosa diria que é um bom auguro para este novo ano que iniciámos, como não sou resta-me esperar com paciência que os tempos calmos cheguem...desde que não sejam demasiados calmos pois alguma turbulência ajuda a "apimentar a vida"!
Segundo o que percebi de todos os relatos que ouvi, será a sua primeira festa de aniversário... aos 10 anos de idade, o que não seria nada de especial, não fossem os tempos que correm tão dedicados a suplantar as festas dos outros.
Ele também parecia, inicialmente, desiludido com o "programa das festas" (ouviu parte de uma conversa uns dias antes): um lanche com a familia soou-lhe a pouco, ainda mais quando comparou com a festa de uma amiga que teve direito a quinta com animais e a piscina.
Tentei explicar de várias formas apresentando argumentos válidos que ele entendesse. Afinal, a amiga vive num pequeno apartamento onde não teria espaço para todas as pessoas, sendo o aniversário dele no inverno seria complicado arranjar piscina e sendo época de férias os melhores amigos dele estariam de férias com os avós e portanto não poderiam vir, e por último, esse tipo de festas por norma saiem mais caras e seria melhor gastar o dinheiro em algo que seja mais do que um espaço que só poderemos usar por umas horitas. Saiu pensativo da cozinha e quando regressou passado uns minutos perguntou: "Oh mãe?! Será que podiamos ter pelo menos um bolo de aniversário!?!?".... Acho que lhe dei explicações a mais, pensei , por isso resolvi dizer-lhe apenas: "Penso que sim filho, algo se há-de arranjar!"
Assim, no dia da festa, quando começou a ver-me preparar as mesas com os doces e salgados preparados de véspera, ficou um tanto quieto a observar: "Isto é tudo para mim?" pergunta ele. "Não, filho, achas? Ía fazer-te mal, é para ti e para os teus convidados"...riu-se: "Oh mãe, francamente!" Diz com um brilho nos olhos. Depois veio o entusiasmo a encher os balões com o pai para enfeitar a sala e em seguida só pensava em provar um pouco de tudo.
...A festa começou um pouco mais tarde do que o programado, mas nem assim diminuiu o entusiasmo. Delirou com os presentes que a restante familia lhe trouxe (até as peças de vestuário, que inicialmente, não mereceram grande atenção, vieram a tornar-se motivo de alegria, mais tarde)...brincou com os primos com todos os brinquedos e jogos novos, correu toda a casa e até deixou tirar uma foto ou outra na hora de cantar os parabéns (detesta que lhe tirem fotografias).
Quando os últimos convidados saíram teve de se arrastar até à cama pois as energias repostas não foram suficientes para aguentar todo um dia de emoções fortes!!!
E ainda estava para chegar a passagem de ano...(ver "cenas dos próximos episódios", ufa, que estas festas nunca mais acabam!!!!)